Clube empresa: Projeto do deputado Pedro Paulo x Sociedade Anônima do Futebol

Vitor Birner
Vitor Birner
Congresso Nacional
Congresso Nacional Getty Images

Por José Francisco Cimino Manssur

Há algumas formas de constituir o clube empresa. 

Duas antagônicas estão na pauta do congresso. 

O autor de uma, a da Sociedade Anônima do Futebol, que diverge muita da encampada pelo deputado Pedro Paulo (DEM-RJ), assina o texto que mostra as diferenças entre ambas. 

 1.  Em 2016, Rodrigo Monteiro de Castro e eu redigimos projeto de lei que visa à criação de um tipo societário novo – a Sociedade Anônima do Futebol – inserida no contexto de um ambiente envolvendo Mercado e Estado para proporcionar aos clubes de futebol do Brasil acesso a novas receitas, fontes de financiamento e modernas formas de gestão e governança.

 2.  É premissa do projeto da SAF a constatação de que a forma de gestão do futebol profissional por meio de associações, que remonta ao início do Século XX, é ultrapassada, contaminada por processos políticos/eleitorais que servem de “diversão” e “passatempo” para uns poucos dirigentes, conselheiros e associados “apaixonados pela política de clube”, inadequada que é, atualmente, ao viés econômico da atividade do futebol profissional e, em especial, limitante da capacidade de obter receitas dos nossos clubes. Por conta desse modelo atrasado, que os times para os quais torcemos desde sempre têm cada vez menos capacidade de competir com os clubes do exterior (mesmo em economias menores que a brasileira), nossos jogadores saem cada vez mais jovens e nossos jovens torcedores cada vez mais se interessam pelo futebol europeu em detrimento do nosso futebol pentacampeão do Mundo. 

 3.  O projeto foi proposto ao Congresso Nacional na forma do PL 5.082/16, de autoria do então Deputado Otávio Leite. Qualquer pessoa que tiver interesse na discussão honesta sobre o tema pode ler o texto do PL 5082/16, inclusive registrado para posteridade no livro “Sociedade Anônima do Futebol  - Exposição e Comentários ao Projeto de Lei 5.082/16” e compará-lo com as notícias sobre a proposta encampada pelo Deputado Pedro Paulo para criação de clubes-empresa no Brasil notará, facilmente, as gritantes diferenças entre as duas ideias, conforme aqui resumidas:

 a.   O projeto do Deputado Pedro Paulo pretende induzir os clubes de futebol a adotarem uma das formas societárias já previstas no Código Civil para atividade empresarial. O PL 5082/16 cria um modelo societário próprio, a SAF, pensado para atender as características especiais da atividade do futebol profissional, e mais, pretende que a adoção da SAF seja absolutamente facultativa ao clube que assim o pretender, preservando a autonomia das entidades esportivas. O PL 5086/16 preserva integralmente as condições atuais dos clubes que pretenderem se manter como associações, não lhes criando nenhum novo tipo de óbice. A SAF é um instrumento de recuperação, financiamento e desenvolvimento da governança dos clubes de futebol à disposição daqueles que optarem por inserir seus clubes no mercado do futebol que será criado como ambiente para o seu desenvolvimento sustentável e concreto.

 b.  O projeto do Deputado Pedro Paulo pretende criar mais um plano de refinanciamento das dívidas tributárias dos clubes de futebol que adotarem as formas empresariais (novo REFIS). O PL 5082/16 parte da premissa de que o Estado Brasileiro já subsidia o futebol há mais de século e não deve mais fazê-lo, inclusive sob o risco de o REFIS de agora ter de ser repetido daqui cinco, dez e quinze anos, indefinidamente. Desse modo, o PL 5082/16 propõe o acesso dos clubes a novas receitas/financiamento por meio da SAF e, com esses valores, que cada um arque com suas dívidas e despesas, inclusive, evitando privilegiar clubes que fizeram grandes dívidas tributárias em detrimento daqueles que cuidaram de manter suas finanças saudáveis. O PL 5082/16 extingue formas paternalistas de relação com os clubes de futebol já tentadas e fracassadas no passado recente.

 c.  Em relação aos impostos futuros, o projeto do Deputado Pedro Paulo pretende equiparar as associações que assim permanecerem aos clubes empresa, como forma de indução à criação dos clubes-empresa. Pretende, ainda, criar, para todos, tabelas progressivas e regime de transição para pagamento dos impostos. O PL 5082/16 não utiliza a questão tributária como indutor para a adoção da SAF, mas sim, propõe um período de transição com a reunião de várias alíquotas numa só pelo prazo definido de cinco anos, após o qual, as SAFs arcarão com os impostos exatamente como todas as demais empresas do mesmo porte e que igualmente realizam atividade econômica, geram empregos e destruição de renda.

 d.  O Projeto do Deputado Pedro Paulo propõe uma nova figura de recuperação judicial para os clubes-empresa, inclusive extinguindo, para o caso, o prazo de dois anos de funcionamento como requisito para o pedido de recuperação judicial. O PL 5082/16 pretende que a SAF, uma vez criada, esteja sujeita à legislação de recuperação de empresa hoje existente e válido para todas as pessoas jurídicas, mantendo indene o clube que a constituiu de eventual falência.

 4.  O que se pode constatar objetivamente a partir da comparação honesta entre o Projeto do Deputado Pedro Paulo e do PL 5082/16 é que há entre ambos divergências profundas, de modo que, também por honestidade intelectual é preciso dizer de forma clara que, se o Projeto do Deputado Pedro Paulo for levado à condição de Lei, não terá sido o Projeto da SAF colocado em vigor em sua integralidade, podendo, apenas, ter o justo reconhecimento enquanto ideia inspiradora da mudança de paradigma na gestão do futebol brasileiro, mesmo que por caminho praticamente opostos àqueles que viriam do projeto apoiado pelo Presidente da Câmara dos Deputados. Do mesmo modo, caso o Projeto do Dep. Pedro Paulo não venha a prosperar, inclusive pelos pontos críticos já apontados, isso não significará, jamais, a “morte” da ideia da SAF e da criação de um ambiente de desenvolvimento do futebol brasileiro contida no PL 5082/16. Após quatro anos de tantos debates com formadores de opinião, dirigentes interessados na mudança real do futebol brasileiro e, por intermédio destes, com a opinião pública, podemos dizer que a semente do Plano de Recuperação e Desenvolvimento do Futebol Brasileiro foi plantada em solo fértil e é de se ter esperança de que irá florescer no tempo certo. 

 5.  Deve ser saudado, por fim, como resultado prático de toda a discussão provocada por tais movimentos legislativos, o aprofundamento do debate sobre mecanismos para aperfeiçoamento e modernização da gestão dos nossos centenários clubes de futebol. Debate este, por sua vez, que não deve ser maculado ou distorcido pela maliciosa interpretação de alguns poucos – cada vez menos - que fazem da política em clubes associativos “agradável passatempo” colocando tal “divertimento” como causa para estagnação da gestão dos nossos times, reféns de modelos que, se faziam sentido no começo do Século XX, hoje já não mais se justificam, uma vez que sempre protagonizado por uma pequena elite de centenas de dirigente, conselheiros e associados dos clubes, em detrimento da paixão de centenas de milhões de torcedores que são a verdadeira razão de existir dos nossos times e, como tal, sabem hoje, que o caminho do retorno do futebol brasileiro aos seus melhores dias passa pela substituição das arcaicas associações por sociedades anônimas do futebol, geridas de forma moderna, responsável, capaz de obter receita e competir de igual para igual com os grandes clubes do Mundo. 

Fonte: José Francisco Cimino Manssur

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