Kane, CR7 e a questão Talento x Esforço
Muito legal ver as declarações de Sandro, ex-volante do Internacional e que hoje joga no Benevento, da Itália, sobre Harry Kane. O camisa 10 do Tottenham é um dos melhores atacantes do mundo na atualidade, titular absoluto da seleção da Inglaterra. Sandro jogou nos Spurs de 2010 a 2014 e se lembra de Kane chegando ao time profissional.
O brasileiro conta que foi difícil para Kane ter oportunidades em um clube que privilegiava atacantes badalados como Adebayor, Soldado, Defoe, Pavlyuchenko. “Chegava centroavante atrás de centroavante e os caras não davam oportunidade para ele”, lembra. O que chamava atenção era a obstinação de Kane por treinar, aprimorar seus fundamentos. Dribles, chutes, cabeceios. "Lembro que, depois de todas as atividades, ele ficava horas chutando bolas no gol, cobrando faltas. Esses gols que ele faz hoje, batendo de fora da área, eu via o moleque fazendo no treino quase todo dia. Recebia e soltava a bomba rápido, sempre preciso. Os goleiros ficavam até com raiva, porque doloridos de tanto que ele chutava (risos)", brinca.
Sandro diz que ouvia até zombarias em relação ao garoto. "Às vezes, os outros jogadores ficavam olhando e davam uma cornetada: 'Olha lá o Harry Kane... Coitado, acha que vai jogar'. Era como se quisessem dizem: 'Eu que vou jogar e ele fica lá só treinando'", revela.
Eu já gostava de Kane, gosto ainda mais depois dessa história. Senti uma pena quando sua cabeçada, mesmo em impedimento, bateu na trave e não entrou. A Juventus, merecidamente, avançou na Champions, mas o Tottenham também merecia passar. Coisas da bola.
Kane me fez pensar um pouco nas doses de talento e esforço que fazem um craque no futebol. Há coisas inatas que definem uma aptidão para os esportes: tempo de bola, coordenação motora, visão periférica, etc. Se o sujeito não traz isso no DNA, melhor esquecer o esporte competitivo. Mas há níveis de domínio dessas habilidades. Sidcley e Sané são ambos canhotos, mas há um oceano de diferença entre a qualidade técnica de um e outro. Kane nasceu com talento e aprimorou esse dom com esforço e disciplina. Por isso é o que é aos 24 anos.
O mesmo se aplica a Cristiano Ronaldo. Talento talhado com enorme dose de esforço. O drible que mais exprime o controle do corpo, aproximando o futebol da dança, ao meu ver, é a pedalada. Pernas avançando em hélice sem tocar a bola, apenas enganando o beque, deixando o adversário tonto e penso para um lado enquanto se vai para o outro. Exige muita coordenação, articulação flexível. O pedaleiro brinca com o corpo. É ginga, malícia, coreografia. Brasileiros são mestres na pedalada. Pois CR7 tem uma pedalada dura, robótica. Não há molejo ali. Dá pra ver que foi fabricada nos treinos. E ele conseguiu um drible muito eficiente, embora sem ginga nem tanta beleza. Puro esforço.
Cristiano Ronaldo é também muito talento, claro. Mas sabe-se que é um doido por treinar. Um superatleta, fisicamente perfeito, com todos os fundamentos de um craque: velocidade, drible, cabeceio, chute com ambas as pernas. Com o esforço, ele foi capaz de levar seu talento a serviço máximo da performance. Por isso, estende seu auge profissional para além dos 30 anos.
Como não pensar nos talentos desperdiçados pela ausência de esforço? Nem vou falar de Garrincha, mas de nomes mais atuais como Adriano e Ronaldinho Gaúcho. Entram, claro, questões psicológicas e sociais que explicam por que craques como eles não tiveram um auge duradouro. Seja lá qual for a causa, fundamentalmente, faltou esforço para maximizar o talento, que é sempre mais difícil de se obter.
Fonte: Maurício Barros
Kane, CR7 e a questão Talento x Esforço
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