Auditoria aponta descontrole em gastos santistas entre 2013 e 2017 e pede mudanças urgentes
Serviços pagos sem qualquer controle de execução e clube fazendo adiantamentos financeiros a terceiros. Um pequeno retrato de como foram as duas últimas presidências do Santos Futebol Clube. Estas são as constatações de uma auditoria forense contratada pelo atual presidente, José Carlos Peres, para analisar todos os 370 contratos firmados pelo clube entre os anos de 2013 e 2017. Feita pela GF Brasil - empresa com sede em São Paulo - a auditoria começou a ser entregue à atual gestão na semana passada. A conclusão dos auditores é que o Santos precisa rever urgentemente sua política de contratação de serviços e estabelecer códigos de conduta para evitar procedimentos nocivos ao clube, como conflitos de interesse.
Entre os casos apontados como exemplo de conflitos está o pagamento para o Hotel Praiano LTDA, localizado na própria cidade. De acordo com os documentos analisados, em 2015 o clube transferiu uma quantia de R$ 150 mil para o estabelecimento, que pertencia a um conselheiro, Márcio Campanelli Costas. Na contabilidade, a informação de que o hotel iria devolver a quantia.
"Entendemos que não se trata de adiantamento ao Hotel e sim de um empréstimo, uma vez que na documentação recebida há a seguinte afirmação “favorecido irá devolver ao Clube a quantia”, afirmam os auditores na análise.
Embora o adiantamento tenha sido feito em novembro de 2015, o clube só recebeu de volta o valor total repassado em dezembro do ano seguinte. Os pagamentos, de acordo com os relatórios, foram feitos parceladamente e após cobranças do clube: R$ 80 mil em janeiro (dois meses depois), R$ 51.004 em junho (sete meses depois). Os quase R$ 19 mil restantes teriam sido utilizados, de fato, com hospedagem.
À reportagem, Campanelli disse que o dinheiro foi necessário para arcar com as despesas de hospedagem e alimentação de 120 atletas que participavam do campeonato Sulamericano feminino sub 20, realizado em Santos. Uma competição da Conmebol, que teve a cidade como sede e envolveu 10 equipes. De acordo com ele, a entidade sulamericana não pagou pelos serviços no prazo acordado, tendo o Santos socorrido o hotel para que o evento pudesse ser realizado na cidade.
Segundo ele, outros hotéis na cidade também passaram pela mesma situação, de não receber no prazo estabelecido. Embora na auditoria conste a informação que Campanellli era membro do comitê gestor do Santos à época, ele afirma que só se tornou parte da diretoria após esta data. Que no dia do adiantamento, era apenas conselheiro do clube.
"Eu mandei todos os meus hóspedes embora para atender ao Santos. Ninguém em Santos queria aceitar essa delegação porque o preço era muito barato de hospedagem, era 120 reais para café da manhã, almoço, lanche e jantar e o Santos tomou prejuízo. Não tem nenhum nexo, nenhum sentido um negócio desses. Eu nunca precisei do Santos pra nada, muito pelo contrário, eu cansei de dar hospedagem de graça. Eu hospedava jogadores do Santos. Como eu levei vantagem nisso, como o Santos levou prejuízo?", rebate o dono do hotel.
Conflitos de interesse em elevados gastos jurídicos
Outro problema apontado pelos auditores foi a fiscalização dos serviços jurídicos prestados ao clube por diversos escritórios. Entre eles, o Bonassa Bucker Advogados que ficou responsável por casos de grande repercussão, como as disputas do clube na negociação do Neymar, a solução de passivos oriundos da criação do fundo de investimento Terceira Estrela Investimento S.A (Teisa Futebol S.A.), o chamado "Projeto Doyen", entre outros.
Na análise dos auditores, que afirmam terem tido acesso a toda a documentação existente no clube relativa a este fornecedor, não há qualquer controle dos serviços executados por este escritório e a contratação foi feita sem concorrência e sem cotação de preços.
"Para a contratação da empresa Bonassa Bucker não houve por parte do SFC nenhuma cotação de preços para a contratação do escritório jurídico, bem como não foi entregue a planilha de horas dos serviços executados", relatam em suas conclusões.
Ao todo, o clube gastou - segundo consta no relatório - R$ 13 milhões com o escritório, sem que se possa aferir o trabalho executado:
A contratação do Bonassa Bucker foi feita por Modesto Roma Júnior no início de sua gestão, justamente para auditar e resolver problemas contratuais de gestões anteriores. Procurado, o escritório rebate as afirmações da auditoria que classifica como orquestrada e afirma em nota que foi responsável por uma economia de R$ 260 milhões ao clube, "sem contar o valor da reversão de direitos econômicos sobre atletas" (veja nota completa abaixo).
Um dos pontos considerados críticos no relatório é a contratação pelo Bonassa, de um terceiro escritório jurídico na Espanha, afim de intermediar o processo no caso Neymar. De acordo com a auditoria, o clube gastou R$ 728.366,40 em cinco meses (200 milhões de euros) com o escritório que não comprovou ter experiência para a execução deste serviço.
Ainda em nota, que pode ser lida na íntegra abaixo, o escritório disse que o Santos não lhe pagou todos os honorários previstos em contrato e, por isso, acionou o clube judicialmente.
A contratação do Bonassa foi duramente criticada nas conclusões da auditoria por ter sido intermediada por uma pessoa ligada ao escritório. Osvaldo Eduardo Cardoso Ribeiro é cliente do escritório e foi ele quem indicou ao Santos os serviços. No clube, Ribeiro era quem tinha a função de controlar os serviços, fiscalizando e exigindo resultados. Seu salário foi de R$ 60 mil, em 2015, até R$ 80 mil, em 2017, o que também foi apontado no relatório como um valor acima do mercado.
O caso é apontado como de extremo conflito de interesse na visão da auditoria, algo que precisa ser corrigido em toda a estrutura santista. As conclusões da auditoria serão enviadas para o Conselho Fiscal e Deliberativo do clube, para que as sugestões sejam discutidas e aplicadas, se aprovadas. Também passarão pelo Conselho Gestor do clube.
Ribeiro não foi localizado pela reportagem. O blog pediu ao escritório que fizesse chegar os questionamentos ao seu cliente, mas não teve retorno até o momento.
O ex-presidente Modesto Roma Júnior também foi procurado. A reportagem enviou duas mensagens informando a importância dos questionamentos para o seu telefone celular atual e não teve retorno. Em dois dias seguidos, também ligou para o seu número, mas não teve retorno.
Nota do Bonassa Bucker Advogados:
Embora jamais tenha tido acesso a qualquer auditoria promovida pelo Santos FC ou por qualquer terceiro, o Escritório Bonassa Bucker Advogados esclarece ter sido contratado pelo Santos FC para a prestação de serviços de assessoria jurídica durante os anos de 2015 a 2017. A escolha do Escritório resultou, de um lado, da expertise de seus profissionais e, de outro, de vínculo de confiança inerente à relação cliente-advogado, inexistindo qualquer tipo de conflito de interesses.
Todos os serviços prestados foram calcados em contratos por escrito, devidamente firmados. Os valores de honorários sempre foram compatíveis com a prática de mercado e com os parâmetros da Ordem dos Advogados do Brasil. A indicação de escritórios de apoio em outras localidades seguiu, igualmente, a praxe profissional e sempre foi pautada na excelência dos profissionais sugeridos. O Clube contratou diretamente os profissionais recomendados.
Em virtude de sigilo, o Escritório está impedido de expor detalhes das atividades desenvolvidas ao longo de três anos. Vale ressaltar que a atuação do Escritório resultou em benefício econômico direto ao Santos FC da ordem de 260 milhões de reais, isso sem contar o valor da reversão de direitos econômicos sobre atletas.
Tendo o Santos FC deixado de honrar os honorários devidos, o Escritório notificou-o judicialmente e, se necessário, prosseguirá com outras providencias.
Fonte: Gabriela Moreira, repórter do ESPN.com.br
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